Por que sou a favor da aprovação da PEC 37
Em vez de admitir a investigação criminal por órgãos e instituições não legitimados para tanto, a sociedade brasileira deveria promover o fortalecimento da polícia judiciária e debater uma maior autonomia policial frente ao Poder Executivo.
O crescente movimento do Ministério Público no sentido da expansão de seus poderes constitucionais e legais tem mais um capítulo polêmico com as severas críticas dirigidas em relação à Proposta de Emenda Constitucional nº 37, em tramitação no Congresso Nacional, conhecida como PEC da legalidade, e maliciosamente denominada PEC da impunidade.[1]
Inicialmente, a PEC 37 tem o objetivo apenas de deixar claro o modelo de investigação criminal adotado pelo Brasil, qual seja, o modelo de investigação policial ou do Delegado-investigador. Assim sendo, ao pretender investigar a qualquer custo, o Ministério Público busca a subversão da ordem constitucional, buscando instituir no Brasil o modelo de investigação criminal fascista e ultrapassado denominado de “modelo do promotor-investigador”.[2]
O primeiro argumento a favor da aprovação da PEC 37 encontra-se em decisão proferida pelo próprio Ministério Público Federal, em acórdão exarado no bojo de processo administrativo, que tramitou na Procuradoria-Geral da República e foi publicado no DJU, de 02/09/98, p. 70. Na ocasião, a 2ª CCR se manifestou de forma contrária ao poder de investigação criminal do MP. Citam-se alguns trechos do referido acórdão:[3]
“EMENTA: Procedimento administrativo criminal instaurado na Procuradoria da República, com fundamento no art. 129, VIII da Constituição Federal, em virtude de expediente que relata a ocorrência de conduta, em tese delituosa, praticada por Deputado Federal. Tramitação de referido expediente em Cartório Criminal, instituído por Portaria da Chefia. Instauração de Procedimento Criminal Administrativo pelo Ministério Público. Impossibilidade face os exatos termos do art. 144, § 1°, IV da Constituição Federal de 1988 – interpretado como garantia constitucional do cidadão de somente ser investigado pela Polícia Judiciária. Situação constitucional diversa do regime anterior. Fundamentos de tal assertiva: juízo de instrução e a legislação processual penal brasileira, em face das garantias constitucionais. Parecer no sentido do imediato encaminhamento do expediente indevidamente autuado ao Procurador-Geral da República, único titular da ação penal junto no Supremo Tribunal Federal Encaminhamento ao Procurador-Geral da República do presente procedimento administrativo, solicitando cancelamento da autuação, bem como revisão do ato administrativo que criou o noticia do “cartório criminal”, em face dos princípios contidos na Constituição Federal (...) a investigação criminal iniciada pelo membro do MP, em procedimento administrativo criminal desenvolvido no âmbito do Parquet, se constitui em prática alheia ao ordenamento jurídico vigente, eivado de inconstitucionalidade– visto que é atribuição exclusiva da Polícia Federal o exercício das funções de polícia judiciária da União – art. 144, § 1º, IV, da Constituição Federal de 1988 e que, ao Ministério Público somente é permitida a instauração de inquéritos civis (...) Esse cuidado do Constituinte de 1988 tem razões históricas, que puderam ser colhidas do período em que vivemos um regime de exceção, quando procedimentos investigatórios sobre a conduta dos cidadãos poderiam –e eram– instaurados por diversos órgãos ligados ao sistema estatal– congêneres– investigações essas que muitas vezes deram origem a prisão de cidadãos, que ficavam detidos pelos órgãos de segurança, restando a seus familiares e amigos procura incessante, para saber onde e porque se encontrava o desaparecido detido. Diante desse quadro bastante conhecido pelo Constituinte, que pretendia editar Constituição que assegure ao cidadão todas as garantias do regime democrático, procurou ele ajustar o texto constitucional, de sorte que o cidadão só pudesse ser investigado por um e determinado órgão estatal, previsto constitucionalmente. (...) Dessa forma, as diligências investigatórias destinadas ao inquérito policial, e futura ação penal, fogem à atuação do Ministério Público porque devem ficar jungidas a quem tenha titularidade para instaurar esse tipo de procedimento, sob pena de restar ferido o princípio do devido processo legal (voto vencedor da Subprocuradora-Geral da República – DELZA CURVELLO ROCHA, acompanhada pelos Excelentíssimos Senhores Subprocuradores-Gerais da República EDINALDO DE HOLANDA BORGES e GILDA PEREIRA DE CARVALHO). (grifei e sublinhei)
O segundo argumento a favor da aprovação da PEC 37 é que o constituinte originário de 1988, em nenhum momento, teve a intenção de conferir o poder de investigação criminal ao Ministério Público, conforme lição do então Ministro do STF Nelson Jobim. É interessante destacar que, durante o julgamento do Inquérito nº 1.968/DF, iniciado em 15/10/2003, o então Ministro do STF Nelson Jobim, que também foi deputado federal constituinte, afirmou se recordar de que uma proposta que concedia expressamente poderes investigatórios ao MP havia sido rejeitada durante uma das históricas sessões da Assembleia Nacional Constituinte e que ele mesmo havia votado contra ela. Daí ser incabível, hoje, a argumentação do MP que o seu pretenso poder investigatório estaria “implícito” na Constituição Federal. [4]
O terceiro argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é que o modelo de investigação policial (Delegado-investigador) foi consagrado pela Constituição Federal de 1988 e pelo Código de Processo Penal Brasileiro, em detrimento do modelo do promotor-investigador e do juizado de instrução. Dessa forma, o inquérito policial representa um direito do cidadão de não ser submetido apressadamente a “cerimônia fúnebre do processo penal”. Dessa maneira, a investigação criminal realizada por outros órgãos públicos não policiais viola o modelo de investigação criminal adotado pelo Brasil. Ora, a opção brasileira pelo modelo de investigação policial (leia-se: inquérito policial e não procedimento investigatório criminal do MP) fica clara na leitura do seguinte trecho da brilhante exposição de motivos do CPP: [5]
“há em favor do inquérito policial, como instrução provisória antecedendo a propositura da ação penal, um argumento dificilmente contestável: é ele uma garantia contra apressados e errôneos juízos, formados quando ainda persiste a trepidação moral causada pelo crime ou antes que seja possível uma exata visão de conjunto dos fatos, nas suas circunstâncias objetivas e subjetivas. Por mais perspicaz e circunspeta, a autoridade que dirige a investigação inicial, quando ainda perdura o alarma provocado pelo crime, está sujeita a equívocos ou falsos juízos a priori, ou a sugestões tendenciosas. Não raro, é preciso voltar atrás, refazer tudo, para que a investigação se oriente no rumo certo, até então despercebido. Por que, então, abolir-se o inquérito preliminar ou instrução provisória, expondo-se a justiça criminal aos azares do detetivismo, às marchas e contramarchas de uma instrução imediata e única? Pode ser mais expedito o sistema de unidade de instrução, mas o nosso sistema tradicional, com o inquérito preparatório, assegura uma justiça menos aleatória, mais prudente e serena”.
Ao contrário de se admitir a realização da investigação criminal por órgãos e instituições não legitimados para tanto, a sociedade brasileira deveria promover o fortalecimento da polícia judiciária e debater uma maior autonomia policial frente ao Poder Executivo. Com essas conquistas, que necessariamente deveria abranger a outorga de prerrogativas e garantias para a autoridade policial, certamente teremos uma polícia judiciária mais eficiente e eficaz, tal como exigido nos tempos atuais. [6]
O quarto argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é que a investigação criminal deve se desenvolver de forma eqüidistante entre as partes, sem favorecimento do Estado Acusação (Ministério Público) ou da defesa. Sobre o tema, PERES (2012) ensina que: [7]
“Com efeito, não existe previsão constitucional que autorize o órgão de acusação a investir-se na condição de polícia judiciária, salvo em situações excepcionais. Este entendimento, aliás, foi sufragado pelo Ministro Cezar Peluso, Relator do RE 593927, (...) De fato, segundo também entendemos, a realização de procedimento investigatório de natureza penal pelo MP vai muito além das elevadas atribuições funcionais que lhe foram outorgadas pelo art. 129 da Constituição Federal (...) Isto porque, no novo sistema constitucional brasileiro, espera-se que a investigação se desenvolva de forma equidistante do interesse das partes - com respeito às formalidades legais e sob o crivo do Poder Judiciário - e não mais esteja a serviço de quem acusa, como nos moldes preconizados pelo modelo fascista que inspirou o Código de Processo Penal. Nem se diga que a função ministerial de controle da atividade policial (art. 129, VII, da CF), por ser mais abrangente (quem pode o mais, em tese, poderia o menos...), a partir de uma interpretação sistemática, teria o condão de infirmar o que acima foi dito”
O quinto argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é que a investigação criminal promovida pelo Ministério Público atenta contra o Estado Democrático de Direito, ao permitir a existência de uma instituição com superpoderes de investigar e acusar, indo de encontro ao sistema de freios e contrapesos e o ideal de separação de poderes de Montesquieu. [8]
Sobre o tema, CABRAL (2011) ensina que:
“É oportuno, ainda, mencionar, que o inquérito policial presidido por Delegado de Polícia exerce o papel de limitação dos poderes do Estado acusador (Ministério Público), pois o Estado democrático de direito não se coaduna com a idéia da concentração dos poderes (...) entende-se, salvo melhor juízo, que a Constituição Federal adotou o sistema policial e, em razão disso, deve ser afastada a tentativa de concentração das funções de investigar e de acusar nas mãos do Ministério Público (criação da figura do promotor investigador) ou a tentativa de implantação do Juizado de Instrução no Brasil (criação da figura ultrapassada do juiz investigador). Além disso, entende-se que todo o sistema de freios e contrapesos idealizado por Montesquieu e materializado pelo Juiz Marshall no julgamento do caso Marbury v. Madison (1803) aponta para o caminho da repartição das funções de investigar, acusar e julgar. Por fim, entende-se que a possibilidade de investigações realizadas pelo Ministério Público em nada contribui para a celeridade da persecução criminal, pois desvia o órgão ministerial de sua atividade principal na esfera criminal, que é a atuação como parte no processo penal.[9]
No mesmo sentido, GOES (2011) aponta que: “dotar o Ministério Público de atribuições investigatórias, além da competência para promover a ação penal, é conferir poder excessivo a uma única instituição, o que, em tese, favorece condutas abusivas, mormente devido à ausência de controle por parte de qualquer outra instância, tornando o indiciado refém do ímpeto da atuação investigativa, e órfão da proteção de qualquer órgão externo”.[10]
O sexto argumento a favor da aprovação da PEC 37 é que o poder de investigação criminal foi conferido pela Constituição Federal exclusivamente à polícia judiciária. Assim, não se pode falar em poder implícito quando a Constituição outorgou o poder explícito de investigar a polícia judiciária. Muito menos pode prosperar o argumento de que “quem pode o mais, pode o menos”. Tal argumento parte de uma premissa equivocada. Ora, cada instituição tem suas atribuições e competências. A investigação policial não é menos importante que a ação penal. Além disso, seguindo esta linha de raciocínio, o juiz (que tem o poder de julgar – dominus processus) também poderia acusar, pois “quem pode o mais (julgar), pode o menos (acusar)”. Nesse sentido, é oportuna a leitura de trecho da lapidar lição de José Afonso da Silva, que assim assevera: [11]
“Outro argumento que consta em favor da competência investigatória direta do Ministério Público é a de que, sendo ele titular da ação penal pública, também há de ter o poder de investigação criminal, sob o argumento de que “quem pode o mais pode o menos. Se esse prolóquio tem algum valor no campo de direito privado, não sei, mas no campo do direito público, especialmente no direito constitucional, não tem nenhum valor. Não é uma parêmia a que se dá valor de regra interpretativa. O que é mais e o que é menos no campo da distribuição das competências constitucionais? Como se efetua essa medição, como fazer urna tal ponderação? Como quantificá-las? Não há sistema que o confirme. As competências são outorgadas expressamente aos diversos poderes, instituições e órgãos constitucionais. Nenhuma é mais, nenhuma é menos. São o que são, porque as regras de competência são regras de procedimento ou regras técnicas, havendo eventualmente regras subentendidas (não poderes implícitos) às regras enumeradas, porque submetidas a essas e, por conseguinte, pertinente ao mesmo titular. Não é o caso em exame, porque as regras enumeradas, explicitadas, sobre investigação na esfera penal, conferem esta à polícia judiciária, e são regras de eficácia plena, como costumam ser as regras técnicas. 12. Assim mesmo se pode discutir sobre o que é mais e o que é menos entre a investigação e a ação judicial penal. A investigação é um procedimento de instrução criminal (preliminar, preparatória) em busca da verdade e da formação dos meios de prová-la em juízo. A ação é um ato pelo qual se invoca a jurisdição penal. Procedimento da instrução penal preliminar, como qualquer procedimento, é uma sucessão de atos concatenados que se registram e se documentam no inquérito policial, que vai servir de base para a propositura da ação penal ou não, conforme esteja ou não configurada a prática do crime, sua autoria e demais elementos necessários à instrução penal definitiva. O resultado positivo da investigação do crime é que constituirá pressuposto da ação penal viável. Sem a investigação prévia da verdade e dos meios de prová-la em juízo é impossível a ação penal, diz bem Canuto Mendes de Almeida.5 Pode-se estabelecer urna relação de mais e de menos entre esses elementos?
13. Demais, se o argumento do “quem pode o mais pode o menos”, assim como o argumento, muito parecido, dos poderes implícitos, fossem procedentes, a coerência exigiria que o Ministério Público assumisse inteiramente as função investigativa”.
O sétimo argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é que a investigação criminal promovida pelo Ministério Público, além de ser ilegal e inconstitucional, é aleatória, discricionária, casuística e com viés midiático, em total desacordo com o princípio da obrigatoriedade da ação penal. Sobre o tema, José Afonso da Silva também aponta que: [12]
“Frise-se que o Ministério Público não pretende substituir-se, indistintamente, a Polícia Judiciária na investigação das infrações penais, mas dispor de meios para obter diretamente, de modo mais célere e eficaz, em determinadas situações e quando o interesse público o exige, as provas e informações que necessita para a formação de seu convencimento sobre a viabilidade da ação penal (p.24). Esse texto é exemplar. Ele reconhece que a competência é da Polícia Judiciária. Implicitamente denuncia que o Ministério Público não tem o poder de investigação na esfera penal, senão não reivindicaria exercê-la apenas em determinadas situações. De fato, ai só se pleiteia substituir-se a Polícia Judiciária “em determinadas situações e quando o interesse público o exige. Quem decide quais são essas ‘determinadas situações, quem decide quando o interesse público o exige’? O próprio Ministério Público a seu alvedrio? Isso só cria incertezas e confusão. Ora, toda investigação criminal é de interesse público. Este a exige em todos os casos em que um delito se manifesta. Qual o critério de seleção, o de maior repercussão na mídia?”
O oitavo argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é que o Ministério Público, ao realizar o controle da atividade policial, não pode realizar a atividade investigativa que é objeto de seu controle. Ora, a Constituição Federal de 1988 conferiu a Ministério Público a realização do controle externo da atividade policial. Desta forma, como regra básica e fundamental de qualquer sistema de controle ou auditoria, “quem controla e fiscaliza, não pode executar a atividade controlada e fiscalizada”. Neste sentido, também é oportuna a leitura da lição de PERES (2012):[13]
“Ao contrário, o entendimento aqui esposado reflete apenas coerência, porque, como assentou o Ministro Peluso é “intuitivo que, quem investiga não pode, ao mesmo tempo, controlar a legalidade das investigações”. Por outro lado, se se permitir que o Ministério Público, futura parte acusadora na demanda, possa se prevalecer de sua posição privilegiada na estrutura estatal para preparar, sem qualquer controle, as provas do que imagine seja seu direito, como, por exemplo, determinando o comparecimento coercitivo de testemunhas ou de investigados às suas sedes, nada justifica que o mesmo não seja garantido à outra parte (a Defesa), o que parece igualmente inadmissível, ao menos no nosso atual modelo de persecução penal. Por isso, parece-nos ilógica a grita de alguns, segundo quem esta seria mais uma “manobra para se garantir a impunidade de criminosos”. A par de leviana, porque lança injusta pecha às polícias estaduais e federal, as quais somente não obtêm mais sucesso nas investigações que levam a cabo por carências materiais, não - salvo exceções - por deficiências morais. Ainda: de onde saiu a estapafúrdia ideia de que o MP seria composto por uma espécie de casta de “vestais”, ou que seriam os membros da instituição necessariamente mais honestos do que os delegados de polícia?”
O nono argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é a economia do Erário e a aplicação do princípio da eficiência administrativa. A existência de diversos órgãos de investigação em paralelo acarretará uma desnecessária, ineficiente e caríssima duplicação das estruturas de investigação e aumento desnecessário de custos ao Poder Público (por exemplo: compra de helicópteros e armamento para a Polícia Federal e compra dos mesmos equipamentos para o Ministério Público Federal). Não faz o menor sentido a existência de uma estrutura de investigação criminal na polícia judiciária e outra estrutura de investigação criminal idêntica no âmbito do Ministério Público. Ao invés da concentração dos escassos investimentos públicos na área de segurança pública, este investimento acabará sendo dividido entre inúmeros órgãos que pretendem usurpar a atividade de polícia judiciária e brincar de polícia. [14]
Também é importante se rebater as falácias utilizadas pelo Ministério Público, ao chamar a PEC 37 de “PEC DA IMPUNIDADE”. Ora, se praticamente 100% das condenações criminais no Brasil decorrem de crimes apurados em sede de inquérito policial, como há de se falar em PEC da impunidade? Pelo contrário, são raríssimas e quase desconhecidas (inexistentes?) as condenações criminais no Brasil baseadas exclusivamente em investigações criminais (PICs) conduzidas pelo Ministério Público. [15]
Ademais, no sentido de se afastar afirmações falsas veiculadas na mídia, cumpre destacar os seguintes argumentos colocados pela ADPF e ADEPOL em defesa da aprovação da PEC 37:[16]
“ENTENDA PORQUE A PEC 37/2011 NÃO RETIRA O PODER DE INVESTIGAÇÃO DE NENHUM OUTRO ORGÃO:
1- A Constituição prevê que o MP é o fiscal da lei e o titular da ação penal pública;
2- A Constituição confere ao MP o poder de requisitar, a qualquer tempo, a abertura de investigações e a realização de diligências investigatórias;
3- A Constituição atribui ao MP o controle externo da atividade policial;
4- A Constituição, de forma expressa, dispõe que compete às Polícias Civis e à Polícia Federal a apuração de infrações penais, exceto as militares;
5- Como a Constituição não confere ao MP o poder de investigação, nem explícita nem implicitamente, não se pode dizer que a PEC 37/2011 lhes suprime tal direito. ORA, NÃO SE PODE PERDER AQUILO QUE NÃO SE DETÉM;
6- A PEC 37 não impede a criação de CPI’s;
7- A PEC 37 não impede a atividade de controle e fiscalização atribuídas legalmente a outros órgãos públicos que não promovem investigação criminal, tais como TCU, CGU, IBAMA, COAF e Receita Federal;
8- A PEC 37 não impede o trabalho integrado entre órgãos de controle e fiscalização, o Ministério Público e as polícias judiciárias;
9- A PEC 37 não impede que o MP e o Poder Judiciário investiguem os seus próprios membros pela prática de infrações penais;
10- A PEC 37 preserva a higidez do sistema de persecução criminal brasileiro, que se funda na separação de atribuições entre órgão investigador, acusador, defensor e julgador;
11- A PEC 37, não invalida nenhuma investigação já realizada pelo MP, ratificando as provas produzidas até a sua promulgação, moderando seus efeitos;
12- A PEC 37 evita a prática de investigações casuísticas, seletivas, sem controle e com o propósito meramente midiático;
13- Por não possuir o poder de investigação, o MP apresentou, nos últimos anos, duas propostas de emenda à Constituição, no intuito de alcançar esse fim, tendo o Congresso Nacional rejeitado ambas, em respeito ao sistema acusatório e a ordem Constitucional;
14- A Ordem dos Advogados do Brasil e a Advocacia Geral da União, visando a preservação da legalidade, manifestaram-se expressamente contrárias ao poder de investigação do MP;
15- A PEC 37 evita abusos, excessos, casuísmos e desvios de finalidade, permitindo apenas investigações legais, com o controle externo do MP e do Poder Judiciário, e acesso à defesa.
O décimo argumento a favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 37 é que a investigação criminal conduzida pelo Ministério Público não obedece qualquer parâmetro constitucional ou legal. Neste sentido, LEONARDO ISAAC YAROCHEWSKYO (2013) ensina:[17]
“A razão pela qual o Ministério Público não pode conduzir investigações criminais é deveras singela. Não se trata da falta de poderes constitucionais para fazê-lo nem de uma questão corporativa qualquer. Falta à investigação conduzida pelo Ministério Público um marco normativo, ditado por lei ordinária. Afinal de contas, em matéria de direito público, os órgãos do Estado são regidos pelo princípio da legalidade estrita, fato que os fiscais da execução da lei deveriam bem conhecer. Quando promotores de Justiça e procuradores (estaduais e federais) agem como se fossem policiais, geralmente o fazem de forma autoritária e arbitrária.
Ressalta-se, ainda, o fato, não raro, de o Ministério Público selecionar a dedo os casos e investigações em que pretende atuar, violando, entre outros, o princípio do promotor natural. Em regra, esses casos são os que merecem os holofotes da mídia.
Vale, para enriquecer o debate, lembrar o julgamento do recurso extraordinário 233.072-4/RJ, em maio de 1999, pela segunda turma do STF. Por maioria, ela decidiu que o Ministério Público é parte ilegítima para realizar investigações preliminares criminais. Em seu voto, o ministro Marco Aurélio de Mello afirmou: "Aqueles que têm poder -já se disse, isso é vala comum- tendem a exorbitar no exercício desse poder. É preciso que se coloque um freio nessa tentativa. Vejo esse processo revelador de uma precipitação do Ministério Público, que, em vez de provocar a abertura do inquérito policial, como lhe cabia fazer, já que o passo seguinte não seria a propositura de uma ação civil pública, mas de uma ação penal, resolveu ele próprio -não sei se teria desconfiado da polícia- promover as diligências para a coleta de peças, objetivando respaldar a oferta, a propositura da ação penal e a oferta, portanto, da própria denúncia. "Dentre os vários argumentos apresentados por aqueles que defendem o poder de investigação do Ministério Público, um é que se um só órgão investiga –no caso, a polícia-, poucos serão os casos a serem efetivamente apurados e julgados em razoável espaço de tempo. Ora, ao prevalecer esta tese, não demorará muito o Ministério Público reclamará o direito de julgar, hoje exclusivo do Poder Judiciário. Se investigações são mal feitas -e "malsucedidas", no dizer de muitos-, é necessário pugnar-se pelo aprimoramento daqueles que exercem a função investigatória, no caso a polícia judiciária, e não simplesmente atribuir a outro órgão ou Poder essa função.
Por fim, ROCHA (2013) assim leciona e afasta qualquer dúvida acerca do pretenso poder investigatório do MP: “A Constituição, nas duas oportunidades que teve de dar ao MP o poder de investigação, não o fez propositalmente: a primeira no art.129 e a segunda no art. 144. Entretanto, deu ao MP poderes de investigação em se tratando de Ação Civil Pública e deu às CPIs amplos poderes de investigação”.[18]
Por todo o exposto, sem a menor pretensão de esgotar o presente tema, verifica-se que a Constituição Federal de 1988 e o Código de Processo Penal Brasileiro adotaram, acertadamente, o modelo de investigação policial, do inquérito policial ou do Delegado-investigador, em detrimento do modelo do juizado de instrução e do promotor-investigador. Assim, entende-se que o estado democrático de direito e a necessidade de paridade de armas no processo penal não se coaduna com o surgimento de instituições superpoderosas, sem nenhum tipo de controle, que tenham o poder de investigar (de maneira secreta, discricionária e sem controle externo) e acusar, tal como pretende o Ministério Público, restando apenas uma pergunta a ser respondida: No estado brasileiro, quem controlará os atos praticados pelo Ministério Público Policial (MPP)?
Por: Bruno Fontenele Cabral
Elaborado em: 05/2013
Fonte: Jus Navigandi