Fernando Alves, Delegado da 9ª DP Natal fala sobre a necessidade do combate ao tráfico de armas
A facilidade na obtenção de armas como pistola e revólveres pelos envolvidos com o tráfico também é tida como uma das causas para o crescente número de assassinatos por armas de fogo na região. "O tráfico de armas é algo que o Estado precisa combater com maior força, mas está deixando de lado. Me pergunto como os bandidos tem acesso tão fácil a revólveres e pistolas. Assim eles armam e qualificam os seus soldados, para fazer a segurança das bocas de fumo e também para matar devedores, denunciantes e concorrentes no tráfico. A impunidade deixa eles livres para resolver questões triviais com assassinatos. Eles sabem que não vão ser desarmados e legitimam sua ação por força das armas que possuem", comenta o delegado.
Fernando Alves, Delegado da 9ª DP: "Ninguém mata de graça hoje em dia. Estas pessoas estão ganhando." Foto: Fábio Cortez/DN/D.A Press
Todas as características, dados e casos que se apresentam na região sob sua jurisdição apontam, para Fernando Alves, o princípio da organização do crime, como aconteceu no Rio de Janeiro em meados de década de 1980, com o surgimento de grupos como o Comando Vermelho e Terceiro Comando. "Estamos vendo o começo de uma rede criminosa organizada. Eles agora agem com um objetivo, buscam o lucro. Nos moldes Sudeste, eles estão formando uma empresa criminoso. Veja o caso recente dos roubos de coletes e armas de fogo de vigilantes de hospitais. É uma ação direcionada. Não estamos mais lidando com bandidos 'pé-de-chinelo'. Eles estão se organizando. Tem funcionários, profissionais, que trabalham na segurança, por exemplo. E a Polícia Civil está desorganizada.", analisa o delegado.
Ele descarta a presença de integrantes do Comando Vermelho e do Primeiro Comando da Capital (PPC), de São Paulo, seja causa para esta crescente organização do crime em Natal. "Não é segredo para ninguém, é dado do Ministério da Justiça, que o crime saturou em pontos do Sudeste e este pessoal está subindo para cá, principalmente para lavar dinheiro. Creio que a situação é que os criminosos potiguares estão em contato com o Rio de Janeiro e São Paulo, mas não há representantes deles trabalhando aqui", frisa Alves. Em março deste ano o Diário de Natal publicou a informação contida em um relatório produzido ano passado pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) de que supostos integrantes do Comando Vermelho e do PCC chegaram a ameaçar autoridades do RN.
O chefe da 9ª DP aponta que o caminho para organização da polícia no combate à criminalidade organizada é longo. Primeiro passa pela questão estrutural, incluindo a contratação e treinamento de concursados, além da compra de armamento e de arsenal tecnológico para equipar a polícia investigativa. "Tenho cinco agentes para uma área de 200 mil pessoas. Não tenho nem um veículo descaracterizado. Fazemos milagre para cumprir os mandados judiciais, em levantamentos que levam meses quando deveriam levar semanas. Para um agente fazer um trabalho investigativo fica difícil, porque ou ele vai no próprio carro, arriscando o patrimônio pessoal, ou vai a pé. Imagine ter que cobrir esta área toda a pé? Teríamos agentes cumprindo o trabalho de ônibus",pontua Fernando.
O segundo, para ele, ponto é transformar a cultura dos governos para com a Polícia Civil. "Os governos, não só daqui mas do país inteiro, não dão prioridade às delegacias de bairro. O investimento todo vai para as delegacias especializadas, que investigam crimes maiores, de maior repercussão, o que traz uma imagem boa. Esta é uma visão atrasada. Nós lidamos com uma suposta pequena criminalidade, mas é a que assusta. 90% da carga dos homicídios ficam nas delegacias de bairro e ainda pensam que somos um mini-juizado criminal, para registrar boletim de ocorrência e resolver briga de vizinho", aponta o delegado.