"Da forma que a ação está planejada, poderá haver uma migração criminal."
"Da forma que a ação está planejada, poderá haver uma migração criminal."
Bate papo com Ivênio Hermes, Especialista em gestão e políticas públicas de segurança; coordenador do Observatório da Violência Letal Intencional - Obvio/RN
Como a questão da violência é bastante complexa, o problema não deveria ser enfrentado com ações transversais abrangentes?
Com certeza. Estão cometendo o mesmo erro de outras gestões ao priorizar o aspecto visual, que traz uma sensação temporária de segurança. Dentro da própria Secretaria de Segurança Pública existem ações transversais: a realização de um novo concurso público para resolver a questão do déficit no efetivo, por exemplo, é uma ação transversal. O certo é que não vai funcionar só investir em policiamento. Não surtirá um efeito concreto na redução da violência.
Que outras áreas devem ser consideradas para o Estado conseguir reduzir os índices de violência?
É preciso envolver a Secretaria de Educação, para que se faça um trabalho de resgate dos alunos que não renovaram matrícula, saber por que está havendo evasão de jovens em idade escolar. O segundo aspecto da transversalidade são as ações sociais, que visam a melhoria do convívio das pessoas nos bairros, a partir de atividades esportivas, de lazer e cultura, encontros comunitários nas igrejas e associações. Iniciativas que promovam interatividade. Também é importante adotar programas assistenciais para tirar pessoas da situação de flagelo, adotar um programa de geração de emprego e renda. Mas o que vemos? O aumento do endividamento das famílias devido o atraso generalizado dos salários.
Com a estratégia adotada há o risco de migração da violência?
Sim. Da forma que a ação foi planejada pela Sesed teremos uma redução dos índices de criminalidade enquanto as operações estiverem em desenvolvimento. Porém, durante esse período, poderá haver o que chamamos de migração criminal. As ações devem ser motivadas por estudos abrangentes e não por reações a eventos recentes, isso reduz a possibilidade de resultados positivos.
Existe no Brasil, mesmo que velada, uma política de encarceramento? Isso resolve?
Existe, inclusive, em muitos casos, incentivada no meio policial, onde essa política de encarceramento é tida como doutrinária, e vista como resultado positivo das ações de segurança. Há no ideário das polícias que tem que se prender. Os orgãos não dizem: tantas pessoas foram recuperadas, ou a reincidência de crimes diminuiu, o destaque é quantas pessoas foram presas. Não é uma política exarcebada, mas está implícita e nem sempre as pessoas percebem.
Essa forma de pensar descarta as prisões?
Não é isso, o que se precisa priorizar são prisões qualitativas: prender grandes traficantes, e não pequenas mulas - que são o elo mais fraco desse tipo de crime. Tem que se prender políticos, que desviam recursos e reduzem a capacidade do Estado de investir em políticas públicas capazes de reduzir os índices de violência. Sou contra o fato de utilizar prisões como indicador de resolutividade criminal.
FONTE: Tribuna do Norte