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A "Nota Atécnica" 7a. CCR, n. 1, de 2014 do Ministério Público Federal

Autor: Eduardo Luiz Santos Cabette, Delegado de Polícia, Mestre em Direito Social, Pós – graduado em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na Pós – graduação da Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado da Unisal.

 

Foi aprovada e segue para sanção presidencial a MPV 657/2014 que enseja autonomia necessária à Polícia Federal, mantendo seus cargos de direção restritos aos Delegados de Polícia que hierarquicamente, por natureza, ocupam os postos de presidência das investigações. Ademais, embora sem determinação legal expressa, já era costume, pela própria evidência dos fatos, a nomeação da direção por Delegados de Polícia. Antes disso, havia uma tradição de nomeação de militares, o que, sem desmerecer de forma alguma esses profissionais, não se coadunava com a natureza civil da instituição.

 

É necessário salientar que antes da MPV 657/2014, qualquer pessoa poderia ser nomeada como diretora da Polícia Federal (um militar como ocorria frequentemente, um historiador, um florista, um industrial, um banqueiro, um político profissional, uma pessoa formada em moda etc.).

 

A Medida Provisória em destaque faz, portanto, nada mais do que estabelecer legalmente o óbvio, além de aprimorar as regras para essa nomeação que já existia, estabelecendo que o Delegado Diretor deverá ocupar o topo da carreira, como é também algo óbvio e que evita manobras de politicagem, onde um novato (ou, como antes, até mesmo um “extraneus”) possa erigir-se em chefe da instituição sem qualquer experiência, apenas por indicação política, por exemplo. Aprimora ainda os requisitos do concurso público para ingresso na carreira, tornando toda a seleção transparente e com fiscalização de órgão da sociedade civil (OAB).

 

A OAB e muitas pessoas de qualidade têm apresentado seu apoio à medida. Inclusive seria despiciendo da parte deste subscritor repisar argumentos já muito melhor delineados por outros como o Emérito Jurista Ives Gandra Martins [1] ou o destacado Promotor de Justiça Rômulo de Andrade Moreira [2] ou ainda o impagável texto do Delegado de Polícia Federal, Paulo Roberto Falcão Ribeiro que, de forma realista, expõe a duplicidade pérfida dos discursos dos críticos da medida (para mim uma lei, para os outros outra lei). [3]

 

Além disso, a chamada “Nota Técnica” (que ora denominamos de “atécnica”), não merece de nossa parte ou de qualquer pessoa ou entidade maior consideração senão um desprezo solene. Por isso, este texto não é elaborado como em geral trabalha este subscritor, ou seja, com rigor acadêmico absoluto, mas constitui-se apenas e tão somente num apontamento, numa mera anotação atécnica que já é bem mais do que mereceria o documento em destaque. A única razão que move a escrita deste texto é o fato de não deixar desavisados aqueles que podem ser atingidos pela divulgação midiática dos falseamentos e engodos constantes nesse documento lamentável. Trata-se, portanto, de um esclarecimento ao público, a fim de que perceba claramente as manobras e falseamentos, não se deixando iludir pela fonte institucional de respeito de onde advém. A fonte é de respeito, o documento já peca nesse ponto.

 

Já aqui temos um dos estratagemas. É conhecido de todos o dito popular de que “a melhor mentira é aquela que anda ao lado de uma verdade”. Ora, a emissão de uma chamada “Nota Técnica” (sic) por um órgão de absoluto respeito e tradição como é o Ministério Público Federal, acaba trazendo consigo, inobstante as maiores absurdidades que sejam ali consignadas, algo que insinua legitimidade, mesmo onde não o há em absoluto. Infelizmente a tradição e respeitabilidade de um órgão pode ser maculada e instrumentalizada para muitos fins espúrios, conferindo a estes uma “capa mágica” de pseudolegitimidade. O próprio título do documento e sua natureza em tese (“Nota Técnica”) lhe empresta uma falsa imparcialidade, um manto de saber científico neutro (afinal é apenas uma Nota “Técnica” descomprometida), onde nada disso existe.

 

A inversão ou, talvez melhor, a perversão das ideias é outra estratégia daqueles que não estão realmente comprometidos com a busca da verdade, mas com a defesa de interesses, ideologias, políticas, ganhos materiais, utilidades etc. Ocorre aqui o travestir-se de uma posição de intelectualidade que, na realidade, constitui uma “traição” ao intelecto e à busca desinteressada da verdade, conforme nos demonstra claramente Julien Benda em sua festejada obra:

 

“Se os homens de espírito adotam uma filosofia que se orgulha de conhecer apenas a oportunidade e de só admitir verdades de circunstância, pergunto se isso não significa, para eles, propriamente rasgar sua carta de princípios e pronunciar seu cancelamento. [4] (...). Entendo com isso que a justiça, a verdade e a razão só são valores intelectuais na medida em que não visam a um objetivo prático”. [5] E, finalmente, citando Gastón Páris: “Aquele que, por quaisquer razões que sejam, patrióticas, políticas, religiosas e mesmo morais, permite-se o menor arranjo da verdade deve ser riscado da ordem dos homens de ciência. Vale dizer que o intelectual rejeita por essência mais ou menos todas as proclamações patrióticas, políticas, religiosas e morais, as quais, enquanto visam uma finalidade prática, são quase todas forçadas a infletir a verdade”. [6]

 

Antes que, como tem sido a tônica desse debate, alguém venha se fazer de desentendido ou mesmo não compreenda sinceramente ou interprete mal o texto do grande intelectual Julien Benda, faço um esclarecimento:

 

O que Benda prega não é uma intelectualidade meramente abstrativa ou inútil, muito menos despregada da realidade (embora, seja obviamente defensor de uma atividade intelectual abstrata e imparcial). Ora, essa interpretação seria subestimar um intelecto do nível de Benda, pois se ele fala em verdade, justiça etc., somente pode fazê-lo tendo em alta conta o mundo tal qual ele é. Tanto é assim que seu realismo lhe permite ter uma visão crítica da intelectualidade de seu tempo e de nossos dias (o autor é sempre atual). O que Benda abomina é a divulgação e defesa de ideias que não têm por sustentação de sua existência ou origem a vontade de buscar a verdade como valor abstrato, mas que têm por detrás algo oculto, uma espécie de “segunda intenção”, muitas vezes maléfica, quase sempre de má fé, visando obnubiliar a visão da realidade tal como ela é em prol de interesses outros que não a busca da verdade. No fim das contas a mensagem de Benda em sua densa obra é simples: honestidade intelectual. Só isso e tudo isso!

 

Também antes que venham com a má fé que quase sempre tem marcado esse debate, afirmar que não atuo de forma imparcial pelo fato de ser Delegado de Polícia Civil do Estado de São Paulo, consigno que, já de imediato, no meu minicurrículo consta claramente essa qualificação, não havendo nada, absolutamente nada, oculto (o que já não se pode dizer de vários textos e manifestações apócrifas, encimadas por pseudônimos ou apelidos ou simplesmente omitindo funções públicas ocupadas pelas pessoas que atuam como se fossem cidadãos desinteressados manifestando suas ideias). Ademais, como podem comprovar todos que me conheçam ou conheçam alguns textos e manifestações minhas, sempre fui contrário a coisas como a PEC 37, a exclusividade de poder investigatório a um órgão, seja ele qual for, a obrigatoriedade do Inquérito Policial como uma espécie de pré – condição “sine qua non” para o Processo Criminal dentre outras coisas de que agora nem sequer me recordo, mas que seriam defendidas por um indivíduo classista que, exatamente ao contrário do intelectualismo de Benda, defenda interesses e não uma busca sincera da verdade. Essas minhas posturas são comprováveis por linhas e linhas escritas, aulas e aulas, palestras e palestras proferidas, podendo ser confirmadas por meus milhares de alunos e leitores. Por fim, é preciso lembrar que já fui inclusive várias vezes interpelado de forma até grosseira sobre a razão pela qual tenho me “imiscuído” em questões da Polícia Federal que não me dizem respeito funcional e não afetam em nada minha carreira específica que é estadual. A resposta, não bastasse o Direito Constitucional de Livre Expressão e Pensamento, é simples e ao mesmo tempo incompreensível para tais pessoas, já pela própria formulação da pergunta: o ideal de defender a verdade sem antever lucros e de não permitir a disseminação de informações falsas ou de erros, inclusive jurídicos, que podem prejudicar principalmente os estudantes mais jovens. Apenas este é o meu interesse.

 

Pois então, a malfadada “Nota Técnica” em comento afirma em seu item 1 que a nomeação de um Diretor da Polícia Federal pela Presidência da República necessariamente como um Delegado de Polícia de Carreira em seu ápice prejudicaria a “hierarquia e disciplina” e coartaria os poderes do Ministro da Justiça frente à Polícia Federal.

 

Não fosse o conhecimento por este subscritor das manobras mais comuns contra a honestidade intelectual que consistem em a) Fingir que se sabe o que não se sabe e b) Fingir que não se sabe o que se sabe, sendo claramente presente esta segunda na alegação acima, seria assustador constatar a falta de raciocínio concatenado que levaria à escrita de uma afirmação tão tresloucada.

 

Ora, o Ministro da Justiça, como, aliás, todos os demais Ministros, são nomeados e demissíveis “ad nutum” pela Presidência da República desde sempre. Portanto, é de trivial conhecimento, impossível de não ser detido por componentes de um órgão como o Ministério Público Federal, que a atuação desse Ministro da Justiça, tal qual a de todos os demais, se dá em plena harmonia necessária com a Presidência da República, sob pena de destituição. Permanecendo a Polícia Federal subordinada à pasta do Ministério da Justiça, continua tendo o Diretor da Polícia Federal como seu superior imediato o Ministro da Justiça. Todos, por seu turno, como sempre, subordinados à Presidência da República. Aliás, à semelhança do que ocorre nos Estados com as Polícias Civil e Militar, seus Delegados Gerais e Comandantes Gerais e o respectivo Secretário de Segurança Pública. Se é o Secretário de Segurança ou o Ministro da Justiça quem nomeia os chefes das instituições policiais a eles subordinadas ou se é o Governo Estadual ou a Presidência da República, diferença alguma existe, pois, ao fim e ao cabo a linha de hierarquia sempre termina no Governo Estadual ou na Presidência e quem está mais próximo a estes órgãos superiores finais são, respectivamente, os Secretários de Segurança e o Ministro da Justiça e não os Delegados Gerais de Polícia, Comandantes Gerais da PM ou o Delegado de Polícia Diretor da Polícia Federal.

 

A independência obtida com MPV 657/14 obviamente não é absoluta, não se trata de anarquia ou da institucionalização de uma rebeldia. Isso sim poderia acontecer numa instituição onde não se sabe quem ocupa escalão superior ou inferior, quem preside e determina os atos e quem os executa. Isso sim significaria inexistência de hierarquia, com que alguns confundem o termo “carreira única”. Nem uma lanchonete funciona sem certo grau de organização hierárquica e divisão de funções!

 

A escolha pela Presidência passa agora a ser menos passível de politização, pois que se restringe legalmente a um quadro de funcionários concursados e com exigências mínimas para ocupar o posto. O ato presidencial que era discricionário e totalmente livre para indicação de qualquer pessoa, se torna legalmente vinculado. Ora, desde quando isso significa desorganização, quebra hierárquica ou ampliação de ingerência política? Configura, na verdade, um freio a tudo isso, claro que, como qualquer freio, também não é absoluto e isento de possibilidades de manobras, mas é um freio. Portanto, já um progresso em relação a uma situação na qual pessoas eram nomeadas ao léu, sem qualquer controle legal, fosse pelo Ministro da Justiça ou pela Presidência, qual a diferença? Acaso o Ministro da Justiça se sustentaria por muito tempo nomeando pessoas para cargos que não fossem da aprovação da Presidência? Que noção há de “cargo de confiança” por parte de uma afirmação como a constante no item 1 da “Nota Técnica” (sic)? Ou será que realmente não conhecem o fato de que um Ministro da Justiça, como todos os demais, ocupa cargo de confiança? Impossível esse desconhecimento.

 

Para completar apenas mais três pontos cruciais, pois, como já dito, não é objetivo deste texto uma análise aprofundada e acadêmica da “Nota Técnica” (sic) que a isso não faz jus:

 

Por incrível que pareça no parágrafo final da “Nota Técnica” (sic) (item 3) está escrito:

 

“O regime de ingresso proposto para os Delegados da Polícia Federal não encontra similaridade com o de nenhuma outra corporação policial do Brasil” (sic) (grifo nosso).

 

É isso mesmo? Erro ou falsidade deslavada? Não sabe e finge que sabe ou sabe e finge que não sabe?

 

Ora, a exigência de atividade jurídica, participação de membro da OAB na banca do concurso e o reconhecimento da carreira jurídica (e só pode ser a esses fatores que a “Nota Técnica” (sic) estaria fazendo menção), é já aplicada por diversos Estados brasileiros nos concursos para Delegado de Polícia (no meu concurso há mais de 25 anos em São Paulo a banca tinha um membro da OAB). Só exemplificando, sem esgotar: Santa Catarina, São Paulo, Amapá, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará, Maranhão, Goiás, Pará e Paraná. Como pode haver ali a alegação de que as exigências para a Polícia Federal não encontram “similaridade” com nenhuma “outra corporação policial do Brasil” (sic)? Pesquise o leitor nos mais diversos editais de concursos públicos para Delegado pelo Brasil afora e verá que há muita similaridade. Muito ao reverso, era a Polícia Federal que estava em descompasso até então com a maioria das Polícias Civis Estaduais já reconhecedoras da Carreira Jurídica, com Membros da OAB na banca e exigindo atividade jurídica prévia. Não é necessário dizer mais nada.

 

Em seguida há na nota (é de pasmar) a alegação de que as exigências para provimento do cargo de Delegado constituem uma “emulação” (sic) às carreias do Ministério Público e Judiciário. Veja o leitor, “emulação” significa no contexto sobredito e no dicionário “rivalizar, competir, disputar preferência, porfiar” [7] Então o Ministério Público Federal (ao menos nessa infeliz “Nota Técnica” (sic) e não certamente de acordo com as consciências de seus ínclitos componentes em geral) sente como um desafio as exigências para a seleção para outro cargo de Estado que nada tem a ver com sua instituição? Será possível? E ainda toma a liberdade de manifestar-se em nome do Judiciário no mesmo sentido! É claro que são “Procuradores da República”, mas teriam “procuração” do Judiciário para tanto? A grande questão é saber que desafio, que desonra, que competição seriam essas? Isso porque os Delegados continuariam sendo Delegados e os Procuradores Federais, Procuradores, cada um na sua função. Realmente é incompreensível a não ser que haja por trás disso outros interesses não revelados, estes sim cheios de espírito de “emulação”. Como, por exemplo, a pretensão velada de cindir a Polícia Federal, tornando-a um órgão fraco, dividido e fácil de encampar. Ah, isso pode ser! O “espírito de emulação” pode estar funcionando como um mecanismo freudiano de projeção, só se for isso.

 

A chamada “Nota Técnica” (sic) não poderia deixar de bater na tecla da questão da inexistência de modelos de organização policial similares ao brasileiro no “Direito Comparado”. Sempre e sempre sem qualquer espécie de aprofundamento e com total desconsideração das especificidades e tradições brasileiras. Jamais iria mencionar, por exemplo, o fato de que na Inglaterra a Polícia sustenta a acusação em Juízo e não há similar ao “Parquet”. Fauzi Hassan Chouke, Membro dos mais destacados do Ministério Público Paulista e pesquisador sério, comprometido com a verdade, já há tempos esclarecia que na “estrutura inglesa” não se conhece “um órgão estatal incumbido da acusação como o MP brasileiro”, assim como que “a persecução penal acaba por ser utilizada na prática pelos funcionários da polícia” ou mesmo pela “sociedade civilmente organizada” ou pelo indivíduo lesado diretamente. [8] Também nunca se iria noticiar o fato de que novamente na Inglaterra (País de terceiro mundo não é?) se está construindo um modelo de instrução e julgamento do que em nossas terras equivaleria às infrações de menor potencial ofensivo, diretamente pela Polícia Judiciária. [9] Outra coisa que de forma alguma se comentaria é que há tanta indignação devido a garantias conferidas (antes tarde que nunca) aos Delegados de Polícia, mas nenhuma manifestação de adotarem-se modelos estrangeiros em que Promotores são demissíveis por análise de simples produtividade (EUA, Japão entre outros). Também não se fala em acabar com garantias de inamovibilidade, vitaliciedade, independência funcional e, principalmente irredutibilidade de vencimentos. Chamo a atenção para esta última porque, não na “Nota Técnica” (sic) ora em comento, mas tenho visto muita gente “muito preocupada” com os gastos governamentais e a carreira de Delegado de Polícia, mas não vejo ninguém propondo a extinção de auxílios (paletó, livros, moradia etc.), nem da irredutibilidade de vencimentos e, quem sabe, uma redução dos próprios estipêndios? Não vejo os demais integrantes da Polícia Federal que também mencionam várias vezes a questão salarial dos Delegados Federais em comparação com a deles, proporem, por exemplo, ganharem o salário dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo ao invés de seus pagamentos bem maiores, embora não sejam Delegados. Ora, isso já iria economizar bastante dinheiro da União e eles receberiam como Delegados! Não seria ótimo? Todo mundo satisfeito e o Estado economizando, eis o melhor dos mundos! Também não devemos esquecer dos valores de diárias percebidos pelos Policiais Federais que poderiam ser extintos ou pelo menos equiparados aos dos Delegados do Estado de São Paulo, que tal? De novo, o melhor dos mundos... Mas, incrivelmente ninguém apresenta essas propostas. Também poderiam ser cortadas as verbas de acumulação de Membros do Ministério Público e pagamentos por deslocamento, venda de férias e licenças – prêmio, seria tão bom não é?

 

Outra coisa, se o “Segredo do Universo”, a “panaceia para todos os males” de qualquer instituição é uma carreira única, então que razão há para que Agentes de Promotoria e Analistas de Promotoria sejam alijados de todas as benesses inerentes ao cargo de Promotor de Justiça? Por que a investigação criminal pelo Ministério Público não poderia ser conferida e presidida diretamente por esses funcionários? Por que o Inquérito Civil Público não poderia ser presidido diretamente por eles? Aliás, qual a razão de ser da existência do Inquérito Civil Público nos mesmos moldes do Inquérito Policial e presidido por um Promotor com formação jurídica? Para que isso? Por que não extinguir logo tudo isso, toda essa burocracia? Para que a exigência de Promotores para essas funções? Essas questões deveriam ser abertas e levadas à discussão se toda a “preocupação” com a Polícia Federal e as demais polícias for realmente sincera. Nesses casos, o que vale ali, vale aqui. Por que não colocar essas questões em pauta?

 

Outra coisa o item 2 da “Nota Técnica” acena com um suposto corporativismo na escolha do Diretor da Polícia Federal dentre os Delegados de Polícia de Classe Especial. Afirma-se ali que o melhor seria a livre escolha de qualquer pessoa para o cargo. Pois bem, partindo desse pressuposto, por que não propor também uma alteração para o fim de que os Procuradores Gerais nos Estados e na União possam ser pessoas de fora dos quadros ministeriais ou mesmo de dentro desses quadros, mas Analistas ou Agentes? Por que não? Se para todas essas mudanças haveria necessidade de alteração constitucional, por que não alterar a constituição, já que não se tratam de cláusulas pétreas? Vamos adotar um anarquismo nas instituições ou ao menos uma espécie de marxismo igualitário, onde ninguém é superior em termos hierárquicos, todos são iguais num mundo melhor e deslumbrante!

 

Aos críticos da MPV 657 faço a sugestão de abandonar a hipocrisia ou, quem sabe, a visão limitada. Ampliem seus horizontes e levem suas ideias revolucionárias às últimas consequências, inclusive cortando em suas próprias carnes, demonstrando assim sua sinceridade, seu comprometimento com a verdade. Desse modo, ainda que estejam enganados, seria apenas erro e não má fé. Rumemos então juntos para o mundo maravilhoso da igualdade absoluta, da anarquia fraterna, das instituições comunitárias em que cada um faz aquilo que lhe apetece sem hierarquias legais, onde tudo corre rápido sem qualquer burocracia, sem necessidade de autorizações e formalidades. Vamos juntos, afinal “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”!

 

REFERÊNCIAS

 

BENDA, Julien. A Traição dos Intelectuais. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Peixoto Neto, 2007.

 

CHOUKE, Fauzi Hassan. Garantias Constitucionais na Investigação Criminal. São Paulo: RT, 1995.

 

FERREIRA, Aurélio Buarque de Hollanda. Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. 8ª. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1949.

 

MARTINS, Ives Grandra. Consulta formulada pela Associação dos Delegados de Polícia Federal. Disponível em www.gandramartins.adv.br, acesso em 15.11.2014.

 

MOREIRA, Rômulo de Andrade. Quem tem medo da independência da Polícia Federal? Disponível em www.jusbrasil.com.br, acesso em 15.11.2014.

 

PINHEIRO, Aline. Policial – Juiz. Polícia na Inglaterra vai aplicar pena alternativa para crimes menos graves. Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-nov-06/policia-inglesa-aplicar-pena-alternativa-crime-grave, acesso em 15.11.2014.

 

RIBEIRO, Paulo Roberto Falcão. A Verdade, em contraponto à Nota de Repúdio do Ministério Público à MPV 657/14. Disponível em http://política.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/a-verdade-em-contrapontoanota-de-repudio-do-ministério-publicoamp-65714/, acesso em 15.11.2014