adepolrn@gmail.com (84) 3202.9443

População relata a rotina em áreas de violência

“O vandalismo tomou conta. É droga, roubos.. as autoridades não dão jeito mais”, desabafa Juberlita Miguel, 54, desempregada. Ela está desacreditada. Moradora de Nossa Senhora da Apresentação, Zona Norte de Natal, como segurança ela se apega a fé e evita transitar em localidades mais “perigosas”, onde notícias de crimes violentos são frequentes.

 

Com 218 homicídios ocorridos no ano passado, segundo dados oficiais do Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (Ciosp), a Zona Norte responde por 41,4% dos assassinatos em Natal. Dentre os sete bairros de lá, Nossa Senhora da Apresentação é o bairro com maior número absoluto de assassinatos, 78 em 2013, o que presenta 35,8% dos homicídios oficialmente registrados naquela área administrativa da cidade.

 

Chefe de investigação em exercício da 9ª DP e sob qual jurisdição está o bairro de Nossa Senhora da Apresentação, a agente policial Elaine Miranda Canella, disse sua área de atendimento “é muito grande” e não tem outra delegacia que auxilie na investigação. “Existe a Deam aqui, mas só investiga crimes cometidos contra mulheres”. Eliane Canella admite que a falta de estruturas das delegacias também contribui para a impunidade, afora outros fatores. Na 9ªDP, exemplificou ela, só tem nove agentes de Polícia Civil e para a locomoção de duas viaturas, “só disponibilizam 40 litros de combustível por semana”.

 

Já na Zona Oeste, que é dividida em dez bairros, foram assassinadas 208 pessoas no ano passado ou 39,5% das mortes ocorridas nas quatro regiões administrativas da cidade. Felipe Camarão é, numericamente, o segundo bairro recordista de homicídios (52) em Natal ou responsável por 11,5% desses assassinatos.

 

Mas, para o delegado titular do 14º Distrito Policial, Luiz de Pontes Lucena, Felipe Camarão é, relativamente, o bairro mais violento de Natal, considerando que tem uma área de 6,54 quilômetros quadrados contra 10,25 km² de Nossa Senhora da Apresentação.

 

Nessa situação, um momento que poderia ser de lazer, na calçada em frente de casa, pode ser o camarote para um crime. Paulo Ferreira, 59, mora em Mãe Luíza há mais de 40 anos. Ele conta que há dois meses estava olhando os netos jogando bola na rua quando ouviu tiros um quarteirão a frente, na mesma via. Todos correram para dentro de casa, e em seguida motos passaram em alta velocidade. Dois haviam sido baleados. “Na minha rua isso não é sempre, mas no bairro, o tiroteio é constante”, relata.

 

A Zona Leste contabiliza cerca de 22% dos homicídios ocorridos no ano passado. O bairro de Mãe Luíza lidera o ranking entre os quatro bairros na lista desta zona, com um total de 23 assassinatos registrados. Ele credita ao tráfico de drogas as altas constatações do crime. “Qualquer preço é o valor da vida”, afirma Ferreira, relacionando as dívidas de compra de substâncias de drogadição como motivo principal para as mortes. “A população sofre com isso, até na saúde somos atingidos”, diz. Ele mora em frente ao Posto de Saúde do bairro e relata que no final de semana é mais difícil encontrar médicos que temem a insegurança do local.

 

Relatos: A vida em áreas de risco

 

“Já foi assaltada uma vez, na parada de ônibus, na Av. Boa Sorte, centro comercial do bairro de Ns. Senhora da Apresentação”. Ela evita ir para os conjuntos mais distantes e diz estar desacreditada das ações de policiamento. Juberlita Miguel, 54, desempregada

 

Morando há mais de 40 anos em Mãe Luíza, ele percebe que o bairro não é o mesmo. Para família, filho e netos avisa: “Depois das 19h não é seguro andar na rua.” Paulo Ferreira, 59, aposentado

 

Sente o resultado da insegurança em seu comércio, em Nossa Senhora da Apresentação, com assaltos. “A medida foi fechar a loja no horário de almoço e contratar um fiscal de segurança.” Elizabete Aureliano, 40, comerciante

 

bate papo: Luiz de Pontes Lucena, delegado de Polícia Civil, a frente da 14ª DP

 

O que se atribui o alto índice de homicídios em Felipe Camarão?

 

Hoje tem que analisar a criminalidade no aspecto geral, as consequências disso ai são inúmeras, onde depois de todos os órgãos do estado, da família e da sociedade falham, ai chega a Polícia, aparece a Polícia para resolver. Então, é um problema psico-social, sociológico e econômico, aonde as periferias, hoje, por falta de oportunidades e incentivos e as melhores condições de vida e devido o ambiente onde vive, e vários fatores nesses locais faz com que essa população se torne mais violenta.

 

O desemprego e subemprego então, contribui também pra isso?

 

Hoje por exemplo, Felipe Camarão é o maior reciclador de lixo do Rio Grande do Norte, com falta de oportunidade para a juventude. Um conjunto de coisas para que a juventude fique na ociosidade, não tenham oportunidade de escolaridade e é também um problema cultural, porque vem os pais que não tiveram oportunidade e não se preocupam com isso.

 

As drogas tem um peso importante na criminalidade?

 

A droga é responsável por 80% dos crimes, direta e indiretamente. Hoje, onde tem crime, se procurar tem droga no meio, ou é usuário, que pratica o crime para sustentar o vício, ou para se manter na venda das drogas, porque o tráfico é um lucro fácil. É de conhecimento de toda sociedade brasileira que as drogas ilícitas são o principal combustível da criminalidade. No nosso país se mata 58 mil pessoas por ano e maioria esmagadora dessas mortes está relacionada ao uso e tráfico.

 

O senhor fala que hoje existe uma “humanização” do crime?

 

Esse é um fator da criminalidade, porque também afeta a Polícia, que prende, mas depois a lei, que é benéfica, manda soltar. O cara mata uma pessoa e com dois anos e meio está na rua por causa da progressão de regime prisional. A esmagadora maioria dos presos do regime semiaberto continua cometendo crimes ou sendo vítimas deles, porque o criminoso se acha no poder de fazer a sua sentença, se tem concorrente da venda da droga vai lá e se vinga, matando. A tendência é essa, porque o sistema penitenciário também não recupera ninguém.

 

 

 

Fonte: Tribuna do Norte